As Regras de Ouro do RPG



Eu sei, eu sei. Parece um tanto pretensioso supor que eu possa elaborar, sozinho, regras que todos os RPGistas devam seguir. Como minha intenção não é parecer pretensioso (não desta vez), vou explicar o motivo desta lista.


Para começar, essas regras, como tudo o que eu escrevo, são formadas por opiniões pessoais. Neste caso,  a ideia surgiu porque estou planejando mestrar, em um futuro próximo, uma campanha de O Um Anel (RPG que, como o nome sugere, tem como cenário a Terra-Média). Cansado de problemas causados por mau comportamento dos jogadores ou por divergências em relação à maneira como as aventuras deveriam ser conduzidas, eu decidi colocar por escrito o que eu exijo de quem vá jogar comigo.



Para jogar comigo, tem que seguir essas regras. Não pense nisso como uma forma de impor minha visão sobre os outros. Mas o Mestre é o jogador que tem mais trabalho, mesmo antes de começar propriamente a sessão. E não há nada mais frustrante que ver todo o seu trabalho ser jogado no lixo por jogadores briguentos, infantis, desanimados ou implicantes.
Assim sendo, considere essas regras como mera orientação. Adapte-as, mude o que discordar. O importante é que todos os jogadores se comprometam a gerar uma experiência divertida.



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1. Todos os jogadores devem estar perfeitamente interessados, focados e empolgados na hora de jogar. Nada de ficar calado durante a sessão inteira e só “ir com a multidão”; nada de desempenhar tarefas paralelas durante o jogo, nada de só falar “Eu ataco com minha espada” no seu turno de combate. Tem que ter boa vontade e ser participativo.



2. A autoridade do Mestre deve ser respeitada. Caso discorde de uma decisão específica, o jogador pode pedir explicação e apresentar argumentos, mas o Mestre dá a palavra final. Também não vale ficar emburrado e intransigente porque sua discordância foi ouvida e posta de lado; lembre-se de que isso é só um jogo, e o Mestre nunca visa o mal de um jogador de propósito. Adapte-se ao rumo que as coisas tomaram, mesmo que ele não se encaixe no que você planejou. É até mais divertido assim.



3. Nada de brigas ou inimizades entre jogadores. Os personagens podem discutir (se estiver de acordo com a personalidade de ambos e os acontecimentos da aventura), mas os jogadores jamais.



4. Se seu personagem abre a boca, é você quem fala. Nada de “Meu personagem perguntou qual é o nome da vaca cor-de-abóbora do rei.” Incorpore o seu personagem e pergunte, com as palavras que você acha que ele usaria. “Ah, mas eu não sou ator, não sei interpretar bem.” Isto aqui não é um curso de teatro. Nem uma audição para um filme. As únicas coisas exigidas são boa vontade e empolgação. Se você atuar mal, tudo bem; não vai ficar para recuperação no final do bimestre.



5. Se seu personagem realiza uma ação, você a descreve em detalhes. Detalhes em tom literário, não detalhes de medida, peso ou distância. As coisas podem ficar na escala do “Meia dúzia de passos” ou “Do tamanho de um palmo.” Use as rolagens de dados (quando houverem) como uma orientação geral de quão bem (ou mal) você se saiu na tarefa, e acrescente detalhes que você acha que enriqueceram sua narrativa. “Ah, mas eu não sou tão bom assim em narrar as coisas.” Assim como no exemplo anterior, o que vale é empolgação e boa vontade. Não exijo (obviamente) que ninguém improvise descrições dignas de um livro.



6. Não seja inconsequente. Por um lado, o RPG é só um jogo. Por outro, os personagens não sabem disso. Nada de sair fazendo merda só porque “tanto faz, o personagem não existe mesmo”. Não grite com reis, não arranque a cabeça de pobres mercadores, não estupre donzelas em perigo, não roube só porque não vai ser capturado, não carregue crânios na cintura e, de modo geral, não maltrate os NPCs sem motivo. A menos que você esteja jogando um RPG de Jackass...



7. Não seja incongruente. Seu personagem tem uma personalidade. Trate de fazer uma bem detalhada, incluindo motivações, opiniões gerais, maneirismos, hobbies e gostos pessoais. Depois, atenha suas ações a esta personalidade, mesmo que isso coloque seu personagem em apuros. Claro que, se seu personagem for especialmente dissimulado, ele pode esconder suas reais motivações durante uma interação social.



8. Seu personagem não é um robô. Ele não deve apenas andar até o objetivo em silêncio, matar monstros, recolher o tesouro e descansar. Se você se deu ao trabalho de elaborar uma personalidade detalhada para ele (acho bom que tenha elaborado), ponha-a em ação, oras! Faça-o conversar com os demais personagens e desempenhar hobbies ou tarefas paralelas à aventura. Uma vez, um grupo com o qual eu jogava começou uma campanha com personagens recém-criados e que não se conheciam. Quando o futuro grupo se reuniu pela primeira vez (em uma taverna, claro) o Mestre propôs que jogássemos um pouco de baralho, incorporando nossos personagens. Além de bastante divertido, cada um já saiu para a aventura com uma primeira impressão dos demais personagens, como aconteceria em uma situação real.



9. Não seja um livro aberto. Seu personagem não tem um perfil no facebook. Portanto os outros personagens não sabem tudo sobre sua vida, seu passado e suas habilidades. A princípio, não deixe que os outros jogadores leiam seu background e sua ficha. No entanto, os personagens atuarão juntos como um grupo e desenvolverão um companheirismo. Assim sendo, use o background como parte do jogo: incorpore seu personagem e pergunte aos outros de onde eles vêm, o que eles fazem e do que eles gostam. Isso pode render conversas e interações muito legais, se todos estiverem bastante sincronizados com seus personagens.



10. Vamos jogar sério. Humor é sempre algo bem vindo. Mas um pouco de foco também não faz mal a ninguém. Se seu personagem tiver bom-humor (um hobbit, provavelmente), permita que ele faça piadas com as situações. Se ele for mal-humorado (um anão, provavelmente), as próprias ações sérias dele podem ser engraçadas e motivo de chacota dos outros personagens. Mas evite piadas fora do jogo, e off-topic de modo geral. E por favor, DE JEITO NENHUM tome uma decisão estúpida ou que contrarie seu personagem só porque você queria “dar uma zuada”. Acredite, nós podemos nos divertir sem transformar a aventura numa palhaçada.



11. Aventuras são algo planejado. Essa é complicada. Há jogadores que querem simplesmente sair andando “por aí”, e querem que o Mestre vá improvisando o que eles encontram como se ele fosse um Gerador Aleatório de Mundo. Isso sempre (tudo bem, podem haver raras exceções) tem como resultado uma aventura simplória e vazia; uma sequência de Encontros Aleatórios e tesouros genéricos sem uma trama que costure os eventos.
Vamos ser um pouco realistas: você não deixa o conforto da sua toca-hobbit e parte em uma jornada cansativa e cheia de perigos mortais só pra andar em “qualquer direção, tanto faz” (é triste, mas já ouvi isso numa mesa de RPG) e ver o que tem no caminho. Não senhor; antes de dar adeus aos elfos de Valfenda, o grupo (de aventureiros, não de jogadores) se reúne, define um objetivo e traça uma rota no mapa (que eles esperam conseguir seguir sem se perder). Nesta pequena reunião (que acontece durante a Fase em Sociedade) cada jogador tem que incorporar seu personagem e usar as palavras dele no debate. Em geral, cada personagem tentará usar seus próprios conhecimentos e opiniões pessoais para interferir no objetivo da aventura e no caminho a ser tomado (“- Vamos descer até o Desfiladeiro de Rohan. São boa gente, os homens da Terra dos Cavaleiros, e amigos de meu povo.” “- Eu digo que estamos tomando o caminho mais longo! Podemos atravessar as montanhas através de Moria; meu primo Balin nos receberia como reis!” Quem se lembra dessas falas?).
Obs: A princípio, as aventuras serão planejadas pelo Mestre. Isso dá aos jogadores a chance de se habituar ao sistema, ao mundo e uns aos outros. Depois que eles visitarem alguns lugares, estabelecerem contatos e amizades com NPCs e começarem a receber notícias de toda a parte, os personagens podem definir os próprios objetivos e jornadas (durante uma Fase em Sociedade). O Mestre então planeja a aventura com base nisso.
Obs2: Uma vez que os personagens decidem seu objetivo e a aventura é planejada, eles devem se ater a ela. “Ah, a gente tava indo para o Sul para entrar na Floresta e encontrar um artefato roubado dos elfos, mas agora decidimos virar pra direção Norte pra ir caçar orcs nas montanhas.” Então a sessão acaba por aqui, eu vou replanejar a aventura e a gente continua na próxima.



12. Atenha-se ao espírito da campanha. Todo cenário (bom, pelo menos) tem um “espírito”, um feeling intrínseco a ele. Ele está relacionado ao ritmo em que a história se move, à forma como os personagens agem, como funciona a magia, como as coisas são narradas. É difícil explicar, mas fácil de perceber ao ler um livro ou assistir um filme. O Mestre deve deixar bem claro o espírito que ele quer para a campanha, e os jogadores devem segui-lo em todas as ocasiões.
Obs: Escolher o nome do seu personagem faz parte do espírito do jogo. Use nomes que se encaixem na raça e na cultura de seu aventureiro, sempre com a orientação e aprovação do Mestre. Nomes “de zuação” estão TERMINANTEMENTE PROIBIDOS.

3 comentários: (+add yours?)

"Trasgo",O Nerd disse...

Me ofendi um pouco com a parte dos crânios na cintura... ninguem nunca soube oq eu queria com eles.

Jim Monteiro disse...

Foi só uma referência. hehe

Belgon disse...

RPG de Jackass deve ser algo interessante. Retardado mas interessante.

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